Encerrou neste sábado (24/08), às 17hs, após três
dias de intensos debates o Encontro Estadual de Educação do Campo da
Articulação Paranaense Por Uma Educação do Campo, na cidade Candói-PR com a
presença de várias autoridades políticas e dos movimentos sociais e sindicais.
O encerramento iniciou com apresentações místicas
por diferentes grupos: índios, quilombolas, ilhéus, camponeses, faxinalenses,
assentados, acampados, bordadeiras, crianças, adolescentes, jovens e adultos,
músicas e muita animação e, em seguida com a leitura da Carta de Candói e da
Pauta de Compromissos construídas por centenas de mãos durante os anos de 2012
e 2013.
Encontraram-se presentes no Evento o prefeito de
Candói Gelson Costa, o vice-prefeito Jeferson Morandi, secretários de Educação,
Saúde, Obras, entre outros. Além das autoridades locais que ofereceram toda
infraestrutura para o evento ser realizado na cidade, fizeram-se presentes
autoridades estaduais, deputados estaduais e federais, reitores de universidades
estaduais e federais que assinaram a CARTA DE CANDÓI acompanhada da PAUTA DE
COMPROMISSOS:
"Por uma política pública, que
garanta aos povos do campo, das florestas e das águas,o direito à Educação
do Campo no lugar onde vivem".
CARTA DE CANDÓI/2013
No inverno de 2013, após treze anos da Carta de
Porto Barreiro, aproximadamente mil pessoas, grupo composto por educadores e
educadoras; educandos, educandas e pais; lideranças e outras pessoas das
comunidades;aproximadamente 120 municípios, representando movimentos sociais e
sindicais, escolas, universidades estiveram reunidos no Encontro Estadual de
Educação do Campo, organizado pela Articulação Paranaense por uma Educação do
Campo, para refletir sobre a atual conjuntura do campo e da Educação do Campo,
comprometidos com a classe trabalhadora na perspectiva de sua emancipação. Esse
encontro é mais uma das expressões de que essa Educação é forjada num processo
de luta da classe trabalhadora, luta pela transformação do próprio campo, pela
qual se busca a ruptura com o atual modelo que tem como marca: a crescente
concentração de terras, a exploração dos trabalhadores, a expulsão desses dos
seus territórios, a pobreza, a possibilidade para a classe dominante de ganhos
enormes e transferência de renda e de mais-valia social. Esse processo de luta
é vivenciado num contexto de disputa não só no campo econômico e político, mas
também educacional. Vivemos num campo marcado pelas contradições: entre a
agricultura camponesa e o agronegócio, entre a produção em larga escala com uso
de agrotóxicos e a produção que respeita o meio ambiente, portanto, a vida;
entre o latifúndio e a pequena propriedade ou a não propriedade; entre patrão e
empregado. Nesse contexto a classe trabalhadora vive um momento de descenso,
por isso, também de desafios, especialmente, no que se refere à organização
coletiva, ao empoderamento dos Movimentos Sociais para o enfrentamento e o
rompimento com o atual estado de coisas.Por outro lado, há o apoderamento pelo
Estado das propostas das políticas públicas da Educação do Campo que que foram
construídas pelos Movimentos Sociais.
Aos sujeitos do campo muito foi negado no que se
refere ao acesso à educação formal. Porém, não houve passividade diante disso.
Os movimentos sociais e outros segmentos organizados estiveram muito presentes
e a partir dos anos 1990, ao realizarem o I Encontro Nacional dos Educadores da
Reforma Agrária (ENERA), em 1997;a I Conferência Nacional Por Uma Educação
Básica do Campo, em 1998, em Luziânia (GO) e, em 2004, a II Conferência
Nacional, pautaram o que nomearam de Educação do Campo, postulando uma nova
concepção de educação (buscando formação omnilateral, para e pelo trabalho, com
estudo partindo das questões do campo, acessando o conhecimento produzido pela
humanidade), com posicionamento político demarcado pela luta de emancipação da
classe trabalhadora, com o protagonismo da mesma e exigência de políticas
públicas que garantissem acesso à escolarização em escolas públicas e de
qualidade social.
No Paraná, especialmente, a partir da II
Conferência Paranaense “Por Uma Educação Básica do Campo”, que aconteceu em Porto Barreiro/PR,
em novembro de 2000, foram ratificados os compromissos e a luta, assumidos
desde o início desse grande movimento. Nesse processo houve conquistas: efetivação
de marcos institucionais e legais que reconhecem a Educação do Campo como
política pública; ampliação da escolaridade, inclusive de acesso ao Ensino
Superior (principalmente em cursos de Pedagogia e Licenciatura em Educação do
Campo, entre outros) e à pós-graduação; constituição de Articulações (âmbito
nacional, estadual e regional), aproximando e integrando os diferentes
coletivos de Educação do Campo; produção de materiais e eventos específicos;
construção de uma identidade de Educação do Campo e outras.
Apesar dessas conquistas entendemos que temos ainda
muitos desafios: o primeiro deles diz respeito à necessidade de efetivar a
Educação do Campo como política pública. A partir disso, faz-se necessária: a
reabertura, manutenção e construção de escolas no campo; a ampliação do acesso
a todos os níveis e modalidades da educação, principalmente Educação Infantil,
Educação de Jovens e Adultos e ensino profissional (nível técnico e Ensino
Superior), garantindo também atendimento em processos de educação especial na
perspectiva de inclusão; busca de garantia de processos de formação inicial e
continuada específicos e vinculados aos interesses da classe trabalhadora;
construção de práticas pedagógicas em espaços educativos do campo, inclusive em
classes multisseriadas, na perspectiva da emancipação humana, partindo da
especificidade do campo, mas garantindo o acesso ao conhecimento elaborado,
socializando-as para potencializar as mudanças necessárias; garantia de
condições adequadas e necessárias para que ocorra um processo educativo de
qualidade, entendendo-as desde a estrutura física aos materiais pedagógicos
(inclusive sua produção); lotação de professores concursados em escolas do
campo; articulação dos sujeitos coletivos da classe trabalhadora; pautar e
fazer controle social das políticas públicas para o campo.
Deixamos aqui registrado nosso posicionamento de
indignação diante dos governos, nas diferentes esferas, que relativizam ou
ignoram totalmente as necessidades de tais sujeitos, não os reconhecendo como
sujeitos de direito,detentores de práticas, de conhecimentos, de valores e de
necessidades próprios.
Entendemos que a Educação do Campo:
- não representa apenas disputa conceitual, troca
de palavras, mas se vincula a uma materialidade imposta à classe trabalhadora
no processo de ampliação e consolidação do capitalismo, que a coloca numa
situação de exploração crescente, até expulsando-a do campo, que se torna campo
do agronegócio, mas também de reação a essa condição e a busca de outro projeto
de campo, de vida e de educação;
- que não é para e nem apenas com, mas dos
trabalhadores do campo;
- é luta coletiva por políticas públicas que não
estejam subordinadas ao economicismo e às determinações do mercado, mas aos
interesses da classe trabalhadora na perspectiva de sua emancipação;
- considera a diversidade dos sujeitos que dela
necessitam, desde as especificidades de trabalho, de cultura, de linguagem e
outros, portanto, reconhece a materialidade específica dos locais onde esses
sujeitos produzem sua vida;
- considera a escola como instrumento importante
para apropriação e produção de conhecimentos, portanto, espaço de ensino e
formação humana;
- é direito social básico, universal e vital e dever
do Estado.
Nós, participantes do Encontro Estadual de Educação do
Campo, assumimos coletivamente este conjunto de convicções e desafios, bem como
a luta necessária para que os povos do campo, das florestas e das águas, tenham
um processo de formação humana com qualidade social.
Essa
carta foi construída, analisada e apoiada pelos participantes, na tarde do dia
24 de agosto de 2013, no município de Candói/PR.
"Por uma política pública, que
garanta aos povos do campo, das florestas e das águas, o direito à
Educação do Campo no lugar onde vivem".
PAUTA DE COMPROMISSOS E LUTAS - CANDÓI/PR-2013